






“Ninho”
08.02.2025 - 15.03.2025
ArteFASAM São Paulo
O sonho do sabiá
Talvez regar o pátio interno seja uma obrigação. Tudo o que não
é praticado se esquece, desvanece. Talvez lembrar da pergunta
seja a resposta para alguma inquietação fundamental. Perguntar
se como um exercício diário. Praticar como para um concerto.
Talvez o voo do pássaro anuncie a ansiedade de sua volta ao ninho.
Talvez o ninho sem pássaros seja como um casulo vazio, deixado
para trás, oco, em prol do voo da borboleta. Migrações implicam
reconstruções: partir com o que é essencial, com o que é leve.
Pássaros não possuem bexigas ou mochilas, muito menos bolsos
e maletas. E, se pudessem nos contar, diriam que levam, em suas
asas, apenas uma rota norteadora e um punhado de expectativas
de sobrevivência.
É bonito, mas ingênuo pensar na liberdade das aves. Ainda que
bela a imagem do voo, elas aprendem desde cedo a deixar ninhos
para trás. E como cantam os pássaros! Apesar de tudo. Talvez
cantem como Tom Jobim canta Sabiá: uma lamúria, um desejo de
volta. Eu vou voltar!
Talvez o sonho do sabiá seja poder cantar para os seus. Depois
de todo esse percurso, voltar para casa e cantar para os seus. Até
que não haja mais forças. E, depois de muitas ninhadas chocadas,
morrer em seu próprio lar. Se as aves pudessem reencarnar, tenho
certeza de que abririam os olhos naquele primeiro ninho.
Arthur Palhano - São Paulo, fevereiro de 2025
TOUR VIRTUAL